Casas “burras” se tornam símbolo de luxo e bem-estar digital
Movimento de “bem-estar analógico” ganha força enquanto consumidores trocam tecnologia inteligente e conectividade por simplicidade
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Nos últimos anos, enquanto o mercado imobiliário celebrava a integração de tecnologia em cada canto da casa — desde luzes controladas por voz até geladeiras que fazem compras sozinhas —, um movimento silencioso, porém crescente, começa a redefinir o que significa um lar moderno. Casas “burras”, ou “dumb homes”, como são chamadas em inglês, estão se tornando um novo símbolo de sofisticação e bem-estar, especialmente entre compradores de alto poder aquisitivo e adeptos do conceito de “bem-estar analógico”.
Essa tendência vai muito além da nostalgia. As pessoas estão criando lares deliberadamente simples, com interruptores físicos, torneiras tradicionais e cantos dedicados ao desligamento digital. Um relatório recente da Zillow mostra que a menção a “canto de leitura” em anúncios imobiliários aumentou 48% em comparação com o ano anterior, indicando uma demanda clara por ambientes que promovam desconexão. A publicação de design Dwell já elegeu o declínio das casas inteligentes como uma das principais tendências para 2025 e além.
Muito além do charme retrô
A rejeição à automação doméstica não se deve apenas à estética ou ao romantismo do passado. Especialistas apontam uma combinação de fatores práticos e psicológicos. Yan M. Wang, arquiteto entrevistado pela Axios, explica que “um lar onde a tecnologia está sempre ao fundo, funcionando e escutando, provoca ansiedade em vez de restaurar”. Esse sentimento é reforçado por questões como o alto custo de manutenção de dispositivos inteligentes, a obsolescência rápida de sistemas e os frequentes problemas técnicos que demandam suporte especializado.
Além disso, a segurança digital emerge como uma preocupação crescente. Em entrevista ao Finantial Times, Leonie Tanczer, professora associada em segurança internacional e tecnologias emergentes da University College London, destaca que “qualquer dispositivo conectado à internet é, por definição, vulnerável”. Dados coletados por assistentes virtuais, câmeras de segurança ou até termostatos inteligentes podem ser explorados por hackers ou usados por empresas para perfis comportamentais. “Se o seu aparelho não está conectado, você precisa estar fisicamente presente para operá-lo — e isso é uma camada adicional de proteção”, observa Tanczer.
Em mercados como Los Angeles, onde a busca por imóveis de luxo inclui cada vez mais exigências de privacidade e tranquilidade, compradores abastados estão evitando eletrodomésticos com Wi-Fi e assistentes de voz. Segundo o Hollywood Reporter, esse movimento é uma tentativa consciente de “escapar da indústria de automação residencial de US$ 100 bilhões”. Paradoxalmente, em regiões com forte cultura tecnológica — como São Francisco e Austin —, as casas inteligentes ainda agregam valor. Contudo, em destinos de segunda residência ou áreas rurais, o retorno sobre o investimento em tecnologia doméstica é questionado, como apontou o corretor imobiliário Andrew Fortune, do Colorado, em entrevista à Realtor.com.