A OpenAI, criadora do ChatGPT, enfrenta um dos maiores desafios financeiros e logísticos da história da tecnologia. A empresa assumiu compromissos para adquirir 26 gigawatts de capacidade computacional junto a Oracle, Nvidia, AMD e Broadcom, o que custará mais de US$ 1 trilhão na próxima década. Para os próximos 12 meses, especialistas estimam que a companhia precisará de ao menos US$ 400 bilhões para honrar apenas parte desses acordos.

A companhia gerou cerca de US$ 4,3 bilhões no primeiro semestre de 2025, podendo chegar a US$ 20 bilhões até o final do ano, mas registrou um prejuízo de US$ 13,5 bilhões. Os números revelam uma disparidade preocupante entre receitas e gastos operacionais, levantando dúvidas sobre a sustentabilidade do modelo de negócios. E esse crescimento parece insuficiente diante dos compromissos assumidos.

Em abril de 2025, a OpenAI captou US$ 40 bilhões no maior investimento privado da história da tecnologia, elevando seu valor de mercado para US$ 300 bilhões. Uma parte significativa do aporte, cerca de US$ 18 bilhões, será destinada à parceria estratégica com a Stargate, joint venture formada entre a OpenAI, o SoftBank e a Oracle. Contudo, há uma condição crucial: o SoftBank informou que seu investimento poderá ser reduzido para até US$ 20 bilhões caso a OpenAI não se reestruture para operar como uma entidade com fins lucrativos até o dia 31 de dezembro deste ano.

Quanto vai custar essa brincadeira?

A construção de infraestrutura para inteligência artificial demanda investimentos sem precedentes. O Bank of America estima o custo de construção de um data center tradicional em US$ 39 milhões por megawatt, subindo para US$ 52 milhões por megawatt para projetos otimizados para IA. Considerando que um gigawatt equivale a mil megawatts, os custos podem ultrapassar US$ 50 bilhões por gigawatt de capacidade dedicada à IA.

Os gastos globais com data centers devem ultrapassar US$ 500 bilhões em 2025, impulsionados principalmente pela demanda de inteligência artificial. Os servidores continuam sendo a maior área de gastos, com operadores comprando 13,5 milhões de servidores em 2024 a um custo de aproximadamente US$ 280 bilhões, sendo que servidores de IA representaram cerca de metade desse total em termos de valor.

Um novo relatório do Morgan Stanley estima que cerca de US$ 3 trilhões serão investidos globalmente em data centers voltados para inteligência artificial até 2029, valor equivalente ao PIB da França em 2024. Metade será destinada à estrutura física, incluindo refrigeração, e a outra metade ao hardware de ponta, incluindo gabinetes de chips da Nvidia que custam cerca de US$ 4 milhões cada.

A questão do consumo energético adiciona outra camada de complexidade. Globalmente, os data centers usam de 1 a 2% da energia do mundo em média, mas a IA está gerando aumentos de consumo que provavelmente elevarão esses percentuais para de 3 a 4% até 2030, segundo relatório do Goldman Sachs. Essa demanda pode sobrecarregar redes elétricas que muitas concessionárias não conseguem suprir, atraindo atenção regulatória dos governos.

Os gastos com construção de data centers nos EUA atingiram uma alta histórica de US$ 40 bilhões em uma taxa anual ajustada sazonalmente em junho, representando um aumento de 30% em relação ao ano anterior, após um aumento de 50% em 2024. Gigantes como Microsoft, Alphabet e Amazon lideram esse movimento, criando oportunidades para empresas de semicondutores como a Nvidia — que viu seu valor de mercado atingir US$ 4 trilhões.

O ChatGPT já atingiu a saturação?

Enquanto a OpenAI promete expansão massiva de infraestrutura, dados sobre o uso do ChatGPT apresentam sinais contraditórios. O ChatGPT já alcança 800 milhões de usuários semanais, um crescimento impressionante frente aos 400 milhões de fevereiro de 2025. No entanto, um estudo da OpenAI mostra que 29% das interações diárias foram relacionadas ao trabalho, uma queda em relação a 47% em 2024. Segundo análise da empresa de análise de mercado de aplicativos móveis Apptopia, o crescimento global de novos downloads mensais começou a se estabilizar depois de abril de 2025, com projeção de queda de ~8,1% em outubro em relação ao mês anterior.

Crescimento de usuários diários no app do ChatGPT nos últimos 12 meses mostra estagnação recente nos meses de setembro e outubro
Apptopia/Reprodução
Crescimento de usuários diários no app do ChatGPT nos últimos 12 meses mostra estagnação

Nos EUA especificamente, o tempo médio gasto por usuário ativo caiu 22,5% desde julho e o número médio de sessões por usuário caiu 20,7%. Esse fenômeno sugere que não apenas a aquisição de novos usuários está desacelerando, mas a intensidade de uso também está recuando — o que pode indicar que o aplicativo passou da fase de descoberta para uma fase mais madura de uso utilitário.

Críticos apontam que esse movimento pode refletir três fatores principais:

  • Saturação do mercado – muitos potenciais usuários já instalaram o app;
  • Aumento da competição – por exemplo com o lançamento do DeepSeek, da High-Flyer, e o app Gemini, do Google, que ganhou força com seu modelo de geração de imagem “Nano Banana” em setembro;
  • Mudanças no posicionamento do produto – a OpenAI ajustou o modelo GPT-5 para ser menos “puxa-saco” e mais factual, segundo relatos, o que pode tornar a experiência menos “conversacional” ou “empática” e impactar o engajamento.

Logo, enquanto o investimento de infraestrutura obriga uma expectativa de crescimento massivo de uso, os dados de engajamento sugerem que o aumento de usuários ativos e sessões pode não acompanhar o ritmo necessário para justificar a o volume anunciado.

Impactos negativos na cognição

Estudos sobre o impacto cognitivo do uso prolongado de ferramentas de IA também trazem preocupações e podem ser outro fator para uma saturação. Um artigo do MIT Media Lab revelou que os usuários de IA tiveram queda de 47% no engajamento neural, com mais de 83% dos usuários do ChatGPT incapazes de citar frases dos ensaios que haviam escrito minutos antes. Os pesquisadores definiram isso não só como dependência, mas como uma “atrofia cognitiva”.

OpenAI e o MIT Media Lab conduziram pesquisas para entender como as interações com chatbots de IA impactam o bem-estar emocional das pessoas. O estudo analisou mais de 40 milhões de interações com o ChatGPT, indicando que usuários que acessam o chatbot com frequência acima da média apresentam mais sinais associados a sentimentos como solidão, ansiedade e busca por validação emocional.

Os riscos de uma bolha

A consultoria Gartner estima que os gastos globais com inteligência artificial alcancem US$ 1,5 trilhão até o fim de 2025, o equivalente a quase 75% do PIB brasileiro de 2024 – esses gastos acumulados podem ultrapassar os US$ 28 trilhões até 2029, ou quase o mesmo que o PIB dos Estados Unidos em 2024. O mercado de hardware e software relacionados à IA deve crescer entre 40% e 55% ao ano, atingindo entre US$ 780 bilhões e US$ 990 bilhões até 2027, segundo um relatório da Bain & Company.

No Vale do Silício, cresce o debate sobre possível supervalorização das companhias de IA. Até 2030, o mundo precisará gerar cerca de US$ 2 trilhões em receitas anuais adicionais apenas para financiar o poder computacional necessário para atender à demanda prevista de IA. O problema é que, mesmo considerando ganhos de eficiência, haverá um déficit estimado em US$ 800 bilhões – o equivalente ao PIB da Suíça ou de Taiwan. O Banco da Inglaterra, o Fundo Monetário Internacional e Jamie Dimon, CEO do banco JP Morgan, emitiram alertas recentes sobre a euforia em torno da IA. Dimon afirmou que “o nível de incerteza na mente da maioria das pessoas deve ser maior do que o que eu chamaria de normal”.

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A questão central permanece: a OpenAI conseguirá equilibrar suas ambições expansionistas com a realidade financeira e as limitações físicas para construção de infraestrutura? Os próximos meses serão decisivos para responder se os planos trilionários de longo prazo da empresa representam visão de futuro ou uma aposta insustentável que pode abalar o setor de tecnologia como um todo.

Com informações de wheresyoured.at e techcrunch.com