Musk entrando no Twitter carregando uma pia de banheiro, em uma piada que ele achou que fosse engraçada
Reprodução/Twitter
Musk entrando na sede do Twitter em São Francisco (EUA) enquanto carrega uma pia de banheiro
 

A inesperada decisão de Elon Musk de encerrar as operações da plataforma X (antigo Twitter) no Brasil deixou credores em estado de alerta. A medida, que veio à tona por meio de uma publicação oficial da empresa neste sábado (17), foi justificada como uma resposta à crescente pressão exercida pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Moraes havia multado a rede social por descumprimento de ordens judiciais, elevando as sanções após a plataforma falhar em fechar perfis exigidos pela justiça.

O advogado João de Senzi, representante de influenciadores digitais brasileiros, reagiu prontamente à situação. Ele protocolou um pedido na 9ª Vara Cível de São Paulo para o bloqueio das contas da empresa, com o objetivo de garantir o cumprimento de uma condenação pendente. “A solicitação visa garantir as obrigações que o Twitter ainda possui no Brasil, principalmente para com nossos clientes”, explicou Senzi, de acordo com o Metrópoles.

Além das questões judiciais, os credores enfrentam dificuldades em contactar a representante legal designada pela empresa, conforme anunciado na mesma publicação que decretou o fim das operações no país. Relatos apontam que a advogada indicada não tem respondido às tentativas de contato, e o telefone registrado na OAB permanece inativo, aumentando a insegurança entre os credores.

O encerramento das operações, que já haviam sido reduzidas para apenas uma representação legal no país, foi descrito pela empresa como uma medida de proteção à equipe no Brasil, após ameaças de prisão ao representante legal da X por parte do ministro Alexandre de Moraes, caso as ordens judiciais continuassem a ser ignoradas.

Musk, apoiador de figuras da direita nacionalista e radical como Donald Trump, Javier Milei e Narendra Modi, tem aumentado a sua ofensiva contra figuras da política brasileira e do STF, em especial Moraes, nos últimos anos, e utilizado as ordens judiciais para remoção de conteúdo criminoso e difamatório — como apologia ao Nazismo, golpes de estado, violência contra minorias e ataques em escolas — na sua plataforma como uma forma de se pintar como perseguido.

Apesar do fechamento do escritório, a plataforma X permanecerá acessível aos usuários brasileiros.

A decisão de Moraes de intensificar as multas, que já acumulavam R$ 300 mil, e de elevar a penalidade para R$ 200 mil por perfil não bloqueado, foi decisiva para o encerramento das operações. A empresa tem agora um prazo de cinco dias para quitar as multas impostas, enquanto credores se mobilizam para garantir o pagamento de suas dívidas antes que a saída da empresa se concretize.

Caloteiro do foguete

No começo do mês, Musk migrou a sede oficial do Twitter da Califórnia para o Texas (EUA), onde duas de suas empresas, SpaceX e Tesla, já estão sediadas, alegando ser um protesto contra uma nova lei estadual de proteção a pessoas transgênero. No entanto, o real motivo pode ter sido o atraso nos pagamentos do aluguel do prédio que ocupava há mais de 10 anos em São Francisco. Em maio de 2023, o dono do imóvel chegou a entrar com pedido de despejo, mas ambos acabaram chegando a um acordo. No mês passado, o X começou a sublocar andares do prédio para outras empresas, antes de se mudar completamente do imóvel.

Nesse mesmo prédio, em outubro de 2022, após adquirir o então Twitter por US$ 44 bilhões, Musk entrou na sede da empresa carregando uma pia de banheiro na tentativa de fazer uma piada com a expressão “let that sink in” (algo como “deixe isso acontecer” em inglês), mas muitos usuários da plataforma zoaram o gesto modificando o significado para “let’s sink this company” (ou “vamos afundar essa empresa”). Aos poucos, parece que Musk vai tornando a piada uma realidade.

Contradições na “liberdade de expressão” de Musk

Como lembra a jornalista Patrícia Campus Mello, em matéria da Folha publicada em abril, apesar de se autodenominar “absolutista da liberdade de expressão”, Elon Musk tem acatado centenas de ordens de remoção de conteúdo emitidas por governos da Índia e da Turquia. Na Índia, o X, sob o comando de Musk, removeu links para o documentário da BBC “Índia: A questão Modi”, a pedido do governo de direita nacionalista liderado por Narendra Modi. O documentário aborda o papel de Modi em um massacre de muçulmanos em Gujarat, em 2002, quando ele era governador do estado.

Musk justificou a remoção, afirmando que as leis indianas são rígidas e não podem ser violadas. No entanto, a atuação do bilionário vai contra suas declarações anteriores de que lutaria contra a censura em redes sociais, como prometido no Brasil. Sob o governo de Modi, a liberdade de expressão na Índia tem sido constantemente ameaçada, com o X banindo contas de jornalistas críticos e removendo publicações contrárias ao governo.

Na Turquia, outro país com um governo autocrático, o X restringiu o alcance de centenas de tuítes antes das eleições presidenciais de 2023, a pedido do governo de Recep Tayyip Erdogan. Questionado sobre essa decisão, Musk respondeu que a escolha era entre limitar o acesso a alguns tuítes ou enfrentar o bloqueio completo da plataforma no país.

A postura contraditória de Musk também foi evidenciada quando ele processou a organização Center for Countering Digital Hate (CCDH) por um estudo que apontava aumento no discurso de ódio na plataforma após sua aquisição. No entanto, um juiz da Califórnia arquivou a ação, classificando-a como uma tentativa de silenciar os críticos.