Mulher sentada em sofá e homem sentado em pufe, ambos digitando em notebooks
Pexels/mart-production

Nos últimos dois anos, a Busca do Google passou por uma série de atualizações significativas, incluindo a introdução de recursos inéditos de inteligência artificial (IA). O objetivo declarado da empresa é melhorar a experiência do usuário e a qualidade do conteúdo encontrado na web. No entanto, essas mudanças estão tendo um impacto desproporcionalmente negativo em pequenos criadores de conteúdo, gerando preocupações sobre o futuro da diversidade e da liberdade de expressão online.

Proprietários de pequenos sites com conteúdo para um nicho específico de audiência têm expressado frustração com a falta de transparência do Google em relação às mudanças no algoritmo e a dificuldade de se adaptar às novas diretrizes. Eles argumentam que as atualizações privilegiam grandes empresas e plataformas em detrimento de sites independentes que produzem conteúdo original, especializado e de alta qualidade.

O Google mantém sua posição de que as mudanças são benéficas para a web, e as alterações no algoritmo de busca são apenas o começo. Na semana passada, durante o Google I/O 2024, o CEO Sundar Pichai, anunciou uma das mudanças mais significativas na história do serviço de buscas, introduzindo respostas geradas por IA nos resultados de busca, um recurso chamado “AI Overviews”. O problema é que o Gemini, o modelo de linguagem generativa desenvolvido pelo Google, tem apresentado constantes alucinações nos resumos mostrados nos resultados. Usuários têm relatado respostas absurdas e imprecisas, como receitas de pizzas com cola como ingrediente e afirmações errôneas sobre a religião do ex-presidente Barack Obama.

As constantes mudanças em como a Busca do Google percebe a web são uma constante corrida de gato e rato contra um dos maiores problemas da internet: o abuso das técnicas de otimização para motores de busca (SEO). Essas técnicas são destinadas a ajustar páginas da web para melhorar o reconhecimento e indexação no Google. Para milhões de negócios que dependem das “engrenagens” dos sites de busca para serem encontrados por possíveis clientes, o SEO pode ser um jogo inevitável.

O problema é que o SEO pode ser abusado. Proprietários de sites comerciais perceberam que às vezes você pode ganhar mais dinheiro criando conteúdo projetado com foco em agradar aos algoritmos do Googlebot, em vez de servir um conteúdo útil para seres humanos que visitam a página. Esse fenômeno é conhecido como “black hat SEO” e inclui práticas como o uso excessivo de palavras-chave, criação de conteúdo duplicado e geração de links de baixa qualidade. Essas táticas visam manipular os rankings de busca, frequentemente resultando em uma experiência de usuário degradada.

A resposta do Google tem sido atualizar continuamente seus algoritmos para identificar e penalizar tais práticas, promovendo um ambiente de busca mais justo e útil. No lado oposto, novas estratégias e técnicas de “black hat SEO” são desenvolvidas para “agradar” as novas diretrizes do algoritmo, mas numa velocidade muito maior.

Os esforços para resolver esse problema nem sempre são bem-sucedidos. No final de 2022 e em março de 2023, a empresa lançou duas atualizações em seu algoritmo com o objetivo de eliminar conteúdo criado exclusivamente para ficar bem ranqueado nos resultados das buscas. O Google diz que o resultado foi “45% menos conteúdo de baixa qualidade nos resultados de busca”. Mas será mesmo?

Dados da ferramenta de análise SEMrush sugerem que o site da New York Magazine perdeu 32% de seu tráfego vindo de buscas no Google no período logo após as atualizações, enquanto o site da revista masculina GQ.com encolheu 26%. Os dados também indicam que o Urban Dictionary, um popular dicionário colaborativo de gírias da língua inglesa (equivalente ao brasileiro Dicionário InFormal), perdeu cerca de 18 milhões de visualizações em suas páginas, o que equivale a mais da metade de seu tráfego originário de resultados de buscas.

Homem sentado em uma cadeira digitando em um notebook em uma mesa a sua frente com olhar de preocupado
Pexels/william-fortunato

Enquanto pequenos sites e portais que produzem conteúdo original lutam, plataformas como o Reddit desfrutam de um aumento significativo no tráfego do Google. Ainda segundo o SEMrush, o tráfego do Reddit apresentou um crescimento de 126% nos últimos seis meses, coincidindo com o declínio acentuado de portais especializados e sites independentes. E a empresa já colhe os benefícios. O Reddit anunciou seu primeiro lucro trimestral desde que se tornou uma empresa negociada na bolsa. Sua receita totalizou US$ 243 milhões – um aumento de 48% em relação ao ano anterior.

Outros sites com conteúdo gerado por usuários, como Quora e Instagram, viram aumentos igualmente astronômicos, e houve picos similares no LinkedIn e na Wikipedia.

Veja também: Reddit, Quora e Stack Overflow vendem conteúdo para OpenAI e Google

Críticos do Google argumentam que as mudanças no algoritmo ameaçam a diversidade de vozes e perspectivas na web. Ao privilegiar grandes plataformas e conteúdo padronizado, o Google corre o risco de sufocar a criatividade e a originalidade, limitando o acesso a informações e ideias diferentes. E quem sofre mais é o elo mais fraco: os pequenos criadores de conteúdo. Enquanto portais como New York Magazine e GQ.com podem investir em buscar tráfego através de outras mídias, como redes sociais, pequenos negócios veem um futuro incerto e com poucas alternativas.

O Google, por sua vez, afirma que está apenas tentando melhorar a qualidade dos resultados de busca e combater o conteúdo de baixa qualidade. A empresa oferece uma variedade de recursos para ajudar os proprietários de sites a entenderem e melhorarem suas classificações na Busca. No entanto, muitos proprietários de sites independentes dizem que essas ferramentas são insuficientes e que a comunicação do Google é muitas vezes confusa e pouco útil.

Enquanto isso, criadores de conteúdo independentes continuam a lutar, esperando que suas vozes sejam ouvidas em meio ao barulho ensurdecedor das mudanças.